terça-feira, 13 de novembro de 2018

Mercado de trabalho ainda é excludente para transexuais


Publicado originalmente no site do Jornal da Cidade, em 12 de novembro de 2018

Mercado de trabalho ainda é excludente para transexuais

Segundo Antra, 90% das pessoas trans estiveram ou estão na prostituição.

Foto: Jadilson Simões

“Eu saí com um cliente e ao terminar o trabalho, ele olhou para mim e disse para eu contar até três, que eu iria morrer naquele momento. Foi ali no Farol da Coroa do Meio há 11 anos. Era um fusca branco e se tratava de um jovem. Eu vi que não tinha bala e reagi. Ele me deu várias coronhadas de revólver. Não sei nem como cheguei ao Hospital João Alves. Perdi muito sangue e fiquei sem memória durante três dias”.

O relato acima é da transexual Jéssica Taylor. Ela foi expulsa de casa aos 10 anos de idade e, aos 11, se viu obrigada a entrar no submundo da prostituição para sobreviver. Isso mesmo, sobreviver. À época, há mais de 30 anos, o preconceito era latente e ecoava aos quatro cantos das imediações do Centro da cidade, principal reduto para aquelas que ousaram ser diferentes.

“Iniciei no Banese Central, até que fui para o Calçadão da Rua São Cristóvão com Itabaianinha. Depois tive que migrar para a Rua da Frente, foi aí que fui conhecer a Rua da Frente, porque a gente parecia morcego e não podia sair durante o dia. A gente se escondia e só aparecia à noite. A sociedade se recolhia e a gente aparecia”, narra Jéssica.

Mas, mesmo que a narrativa não dissesse o tempo exato dos acontecimentos, poderia ser facilmente confundida com os dias atuais, como se fosse um caso que tenha acontecido no início desse ano ou, até mesmo, na semana passada. A realidade continua semelhante.

Segundo o Relatório da violência homofóbica no Brasil, publicado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a transfobia faz com que esse grupo acabe tendo como única opção de sobrevivência a prostituição de rua.

E esse dado é ratificado pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), que, com base em dados colhidos nas diversas regionais da entidade, aponta que 90% das pessoas trans recorrem a essa profissão em algum momento de suas vidas.

Para a presidente da Associação de Travestis e Transgêneros de Aracaju (Astra), Tatiane Araújo, nada mudou. Pelo contrário, o mercado de trabalho para essas pessoas tem se tornado um ataque à ideologia de gênero.

“Eu denuncio isso há mais de 15 anos. Eu mesma, coordenei um projeto ligado a uma ONG internacional, há 10 anos, onde levantamos que travesti e transexuais possuíam como única alternativa de vida, a prostituição. E a gente vê que o dado não se altera. O mercado de trabalho discrimina e isso se reverbera na exclusão social, onde só resta a esquina, que muitas vezes, não é segura. Um dado que reflete essa mazela social”, lamenta Tatiane.

Ela continua: “Há uma carga de falta de informação e ataque à ideologia de gênero. Não que a prostituição seja algo errôneo, que as pessoas devam se envergonhar dela, porém, não deve ser a única alternativa de uma pessoa trans para a sobrevivência. As trans que conseguem vencer a barreira do preconceito da esquina, elas trabalham no mercado informal como cabeleireiras”.

Mesmo com toda essa história triste e de superação diária, Jéssica Taylor não se deixa abater. Ela fundou há 20 anos a Associação de Travestis Unidas, presidida, atualmente, por ela. A entidade serve como apoio principal para aquelas que, assim como Jéssica, ousaram se tornar donas de sua própria história em busca da tão almejada felicidade.

“O sonho que eu tenho é que eu possa dormir e acordar sem ter que ver nenhuma travesti e transexual ser violentada”, finaliza Jéssica Taylor.

Texto e imagem reproduzidos do site: jornaldacidade.net

Nenhum comentário:

Postar um comentário